O reconhecido psiquiatra Enrique Rojas, escreveu no "El Mundo", que há sombras surpreendentes na cultura ocidental, de um lado o materialismo, onde só conta o que é tangível, o que se toca, o que se vê e se consome. Junto com o materialismo o hedonismo sempre insatisfeito, a terminar em fenómenos de ansiedade. A permissividade, que tudo quer experimentar e está a par de um relativismo em que tudo pode ser justificado. Daqui, surge um novo humano repleto de coisas mas vazio interiormente e como consequência assistimos a atitudes de especial melancolia e indiferença. Dá-se um salto para a desumanização. Diz Rojas, que nunca ao longo da História nos havíamos preocupado tanto com o humano e por sua vez nunca como agora, este esteve tão esquecido, tão coisificado, tão reduzido a objecto.
As forças vivas da sociedade têm evocado a Escola e continuam a evocar a Escola como reduto de salvação, reconversão e reconstrução de uma nova geração, de um novo paradigma e civilização. Porém, os factos recentes, o sentir das dinâmicas educativas é também de desamparo, desmotivação e incoerência. As instituições, onde vivem a maior parte do tempo dos nossos jovens, são tal como os valores vigentes das suas comunidades, estruturas fechadas, padronizadas, burocráticas e alimentadas por concepções tecnicistas, que pouco privilegiam o pensamento filosófico, artístico e ético. As disciplinas, as áreas do saber, os conteúdos que mais trabalham ou poderiam desenvolver competências humanas e cívicas, o carácter, a sensibilidade e empatia são diluídas por rankings e estatísticas estéreis do sucesso/insucesso educativo. Há fortes e graves incongruências entre as prioridades quotidianas de uma Escola e a consciência de um caminho progressista para as nossas vidas e as vidas de todos os que coexistem neste planeta.
As famílias, que não prestaram provas de poderem acompanhar e educar uma criança, demonstram (apesar de bem intencionadas), uma impotência e muitas vezes negligência no processo de desenvolvimento dos seus filhos e filhas, que como estes, apresentam tantas vezes comportamentos de imaturidade e desresponsabilização. É viver num estado dormente, alienado e depressivo resultado do pouco entendimento que cada um tem de si próprio e do lugar onde coabita. Os nossos conterrâneos não estão felizes, sendo que a felicidade não se cria por formulários, pelo que se acumula, pelo que se ostenta. A felicidade é uma frágil arte da sabedoria, é a atenção a um despertar interior que se ramifica por cada decisão harmoniosa que tomamos.
A cultura, a arte, a literatura, o pensamento têm tudo para germinar e fazer enobrecer as comunidades. A cultura, tem sido perspectivada no nosso país como um domínio paralelo, desligado das nossas vivências e um sector estratégico com deficitário investimento. Esquecemo-nos frequentemente como somos uma espécie cultural, que se recria por princípios e valores de respeito e conhecimento. Que enquanto espécie gregária, consciente e criativa só florescemos de dentro para fora, a partir de uma vivência estética, simbólica e espiritual. A educação artística de qualidade é emancipadora, não apenas pela resposta que dá às necessidades estéticas, expressivas e de inovação mas porque é alicerce à construção do ideal humano e daquilo que é essência, beleza e espírito. O conhecimento inerente à formação artística redefine com frescura, novas percepções da realidade e novos reposicionamentos perante desafios evolutivos.
Laíz Vieira
Março de 2012
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